terça-feira, 3 de julho de 2012


Para que servem congressos?

Acabo de voltar de dois excelentes congressos: ATBC 2012 e VI CBMz. Observando o comportamento geral de muitos alunos nesses eventos, resolvi escrever este artigo curto. Bom, indo direto ao ponto: para que servem congressos, afinal de contas? Como alunos podem aproveitar melhor as oportunidades que surgem nesses eventos?
Como já comentei em outros artigos curtos aqui no blog, a ciência é uma cultura humana. Como tal, ela tem valores, objetivos, costumes e rituais próprios, que definem sua identidade de grupo. Os congressos são um dos rituais mais valiosos. Isso porque cientistas, em 90% do tempo, comunicam-se apenas de forma escrita através de artigos, mas nada substitui uma comunicação ao vivo e a cores.
É nos congressos que novas parcerias são estabelecidas e laços antigos são fortalecidos. Pode-se até começar um contato com um colega por e-mail, mas é só depois de um congresso ou de uma visita pessoal que a colaboração realmente engrena. Além disso, é comum cientistas fazerem amizade entre si, até mesmo porque passam tanto tempo envolvidos com o trabalho, que conhecem poucas pessoas novas fora do círculo acadêmico. Há colegas que você só encontra em congressos. Outro ponto importante é que em congressos de alto nível é possível tomar conhecimento de novidades que estão aparecendo em cada área. Nos congressos mais regionais isso é mais difícil, mas nos internacionais geralmente surgem novidades bem legais. Também não podemos nos esquecer de que congressos são ótimos para fazermos propagandade trabalhos recém-publicados ou no prelo. Por isso, cientistas profissionais (i.e., os que já terminaram a pós e ocupam cargos de professor ou pesquisador) dão grande valor aos congressos, tentando ir em tantos quanto podem.
É claro que, depois de adquirir experiência, você começa a priorizar alguns eventos em detrimento de outros. Um cientista já calejado leva em conta uma combinação de fatores como tema, rigor na seleção de trabalhos, tamanho do evento, cidade ou país onde ocorre, e pessoas que o freqüentam. Botando tudo na balança, cientistas profissionais, em geral, participam no máximo de um a três congressos favoritos por ano. Até mesmo porque a preparação toma muito tempo e o financiamento para eventos é limitado, ainda mais os internacionais, que podem ser bem caros.
Mas e no caso de alunos que ainda estão cursando a graduação ou pós-graduação? Vale a pena ir a congressos, considerando que eles raramente têm financiamento para tal? Minha resposta é sim, com certeza! Se não tiver um projeto te bancando, dê um jeito. Vá vender limão na esquina para juntar grana, se for preciso. Congressos valem à pena para os alunos pelas mesmas razões que motivam os cientistas profissionais: networking e atualização. No caso dos alunos, as vantagens são maiores ainda, pois eles ainda são pouco conhecidos e conhecem pouca gente. É nos congressos, através de pôsteresbem feitos, palestras bem apresentadas e conversas inteligentes, que alunos podem começar a fazer um nome. Não se engane: é fundamental publicar, mas são os congressos que te tornam conhecido e consolidam sua reputação como cientista. Uma coisa alimenta a outra. Através de bons contatos feitos em congressos muita gente arruma estágios, orientadores de mestrado e doutorado, e até mesmo empregos.
Infelizmente, vejo que alunos da nova geração (nascidos nos anos 90 ou final dos 80) não têm mais tanto traquejo para otimizar sua participação em congressos. Talvez seja um fruto de uma vida excessivamente online e infantilizada, na qual muitos crescem hoje em dia. Não aprendem mais profundidade e foco, apenas multi-tasking. Não aprendem mais a abordar e se comunicar com os mais velhos. Não aprendem mais como fazer networking na vida real, fora das redes sociais.
Muitos alunos nerds preferem assistir obsessivamente a quase todas as palestras nos congressos, ao invés de trocarem idéias com os colegas. Outros alunos mais sociais preferem chutar o balde e cair na gandaia toda noite, acordando tarde no dia seguinte, sem condições fisiológicas de prestar atenção em nada. Não que não se possa enfiar o pé na jaca de leve; um pouco de social em congressos não faz mal a ninguém, mas desde que com controle e moderação. Há alunos meio bichos-do-mato que ficam com vergonha de falar com colegas mais velhos; isso é ridículo para alguém que já está na faculdade e tem 20 e poucos anos na cara. O problema é que muitos alunos, tanto os nerds quanto os sociais e bichos-do-mato, no final das contas, caem na armadilha do “depois escrevo para esse professor”.
Tolinhos… Bons cientistas, que já ocupam cargos de professor ou pesquisador, ou até mesmo postdocs em começo de carreira, têm pouquíssimo tempo livre e recebem toneladas de e-mails por dia. Profissionais com destaque em uma determinada área respondem apenas uma pequena parte dos e-mails que recebem; não por serem esnobes, mas simplesmente por falta de tempo. Se fossem responder a todo mundo que lhes escreve, não fariam mais nada da vida e não seriam tão produtivos. Assim, seu e-mail enviado do além, sem contexto, tem pouquíssimas chances de ser respondido. A não ser que você crie um diferencial.
Se você tiver falado pessoalmente com o cientista-alvo durante o congresso, ele provavelmente vai se lembrar de você e dar mais atenção ao seu e-mail. Assim você se destacará na multidão, especialmente se tiver tido uma conversa interessante com ele. Não adianta apenas chegar junto do professor e falar “admiro seu trabalho, sou seu fã”. Fale algo mais concreto, cite um trabalho específico e diga porque gostou dele. Faça perguntas sobre temas relacionados ao seu projeto, nos quais o sujeito é especialista. Pense antes de falar, planeje por alto a conversa, mas sem dar uma de mala-sabichão. Não interrompa uma conversa que o seu alvo estiver tendo com outra pessoa; espere por brechas e seja educado. Isso vai causar uma boa impressão e te dar um valiosíssimo “crédito de atenção”.
Sendo assim, quando for ao próximo congresso, vá com a mente focada. Não perca seu tempo assistindo dezenas de palestras. Assista apenas as mais interessantes e gaste a maior parte do tempo conversando com a maior variedade possível de colegas, tanto os menos experientes, quanto os mais experientes. Para um cientista experiente, um coffee break com 30 minutos oficiais, na verdade, dura 90. Reforce o contato com os colegas que já conhece. Quando for apresentar um pôster, não fique de bate-papo com os amigos; use o tempo da sessão para responder perguntas feitas por gente que você ainda não conhece. Na hora de apresentar uma palestra, tente causar a melhor impressão possível e puxe papo no intervalo com os outros palestrantes da mesma sessão. À noite, freqüente as festas e cocktails do congresso, até mesmo para relaxar. Faça um bom social com os colegas, mas sem beber até cair e sem ir dormir tarde demais, para estar em boas condições no dia seguinte. Se passar do limite uma vez ou outra, tudo bem, desde que não pague mico na frente de todos (e.g., subir na mesa e fazer um strip). Mas não perca a linha em todas as noites do congresso, a não ser que você seja o Wolverine e tenha um fator de cura mutante.
Minhas três últimas recomendações para congressos são: networking, networking e networking. Se quiser aprender sobre um assunto, não procure um congresso relacionado; vá fazer um curso.

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Fazendo aqui uma pausa e supondo que o texto acabaria aqui, muito provavelmente você perguntaria: " Mas então não falas da liberdade de escrever?" ou algo assim do género, no qual eu respondiria " Se sois livre para escrever, escreve o que queres, além do mais que a opinião é tua, ora essa".